Há cinquenta anos, a 20 de Janeiro de 1973, era assassinado o líder nacionalista Amílcar Cabral, em frente à sua casa baleado por militantes do PAIGC. Este assassínio, porém, não dita o fim da História: nos meses que seguiram ao funeral de Cabral, os serviços franceses e portugueses tentam criar um plano para derrubar Ahmed Sékou Touré. A operação fica conhecida como "Safira". Porém, a Revolução dos Cravos em Portugal, impede que este plano fosse lançado. Para assinalar o dia 1 de Fevereiro de 1973, dia do funeral nacional de Amílcar Cabral, Ahmed Sékou Touré decidiu, como fazia por vezes, redigir um poema. “Onde estão eles ? / Os grandes soldados do Progresso, / Os gigantes da grande luta / Gerados pela coragem consciente / E gerando a consciência da coragem?". O texto intitulado "Onde eles estão?". É dedicado “a todos os mártires do colonialismo”. "Cabral e Mondlane / N'Krumah e Lumumba / Em nós e depois de nós / Sempre honrados, viverão / A Revolução chegará aos céus!"[1]Após o assassínio, os relatórios dos serviços portugueses dão conta de que o dirigente guineense tinha reforçado a sua posição no PAIGC. Nos meses que seguiram ao assassínio do líder independentista guineense e cabo-verdiano, surge uma nova operação. Desta vez, a operação visa derrubar o regime de Sékou Touré e fica conhecida como "Safira" .A operação é tornada pública meses depois de ter sido abandonada, mas ganhou mediatismo na imprensa portuguesa: O jornal Expresso, na sua edição de 24 de Janeiro de 1976, publicou relatórios internos da DGS, entidade que sucedeu em 1969, à PIDE , a polícia política do regime ditatorial português.“Operação 'Safira' tenta ressuscitar Operação "Mar Verde" [2], escreve o jornal, referindo-se ao ataque abortado de Novembro de 1970 em Conacri. O novo plano prevê um jogo de manipulação complexo que visa fomentar divisões dentro do PAIGC, na esperança de enfraquecer o Presidente guineense Ahmed Sekou Touré e permitir uma nova operação dos opositores guineenses exilados da FLNG (Frente de Libertação Nacional da Guiné [Conacri]).Uma aliança entre contestatários do PAIGC e a oposição guineense em exílioPrimeira etapa da operação: exacerbar as tensões no seio do PAIGC, quer se trate das clivagens entre os mulatos cabo-verdianos e os negros da Guiné-Bissau ou a existência de duas tendências ideológicas. Uma delas é “comunista, ou pró Sékou Touré” e, do outro, “a dos pró ocidentais ou anti- Sékou Touré”, será esta “facção dissidente que pretende levar a efeito um golpe de Estado dentro do PAIGC”.Nos relatórios da DGS, revelado pelo “Expresso”, os serviços de informações portugueses afirmaram que um grupo da Guiné-Bissau, da vertente africana, “conscientes de que o PAIGC é um instrumento dos cabo-verdianos manobrado por Sékou Touré”.O “Expresso” também revelou os relatórios das missões de dois agentes infiltrados no seio do PAIGC. Um deles, com o nome de código Padre, encontrou-se mesmo com Samba Djaló, responsável da segurança do PAIGC pela região Norte, a 23 de Agosto 1973. O encontro aconteceu em território senegalês onde Djaló estava baseado. Este membro do PAIGC parece manipulável. Segundo o jornal, ele terá dito ao agente que trabalhava para Portugal que Aristides Pereira, o novo chefe do PAIGC, "não está à altura do seu cargo, não passando de um fantoche manobrado por Sékou Touré que é quem toma todas as decisões importantes ”.Segunda etapa da operação: os opositores da FLNG (Frente Nacional da Libertação da Guiné [Conacri]), que tinham sido integrados na operação Mar Verde, devem agora contactar os dissidentes do PAIGC tendo em vista uma acção comum com Conacri prevista para “o fim de Junho, início de Julho" [de 1974, NdR]. O Coronel Thierno Diallo, um dos chefes desta oposição no exílio, é o primeiro apontado para suceder a Sékou Touré.Um plano elaborado "com franceses do SDECE"Ficamos a saber no semanário Expresso que se trata de um plano cujas “grandes linhas de acção" teriam sido traçadas com os franceses da "SDECE” [Documentação externa e serviço de contra-espionagem, Nota da Redacção]. Nos referidos documentos encontram-se relatórios da DGS de Bissau, que chegaram a Lisboa a 5 de Novembro de 1973, foram revistos para depois serem enviados para Paris. Os documentos descrevem os pormenores para preparar a operação.Os documentos eram dirigidos a "um tal Koch da SDECE e ao coronel Lacase, director dos serviços de informação do mesmo organismo". Lacase? Sem dúvida, o coronel Jeannou Lacaze. Koch? Durante muito tempo, esse foi a alcunha de Jacques Foccart.Sinal de que existiam ligações internacionais nesta operação, o plano beneficia, segundo os documentos do Expresso, de investimentos financeiros "brasileiros e europeus", recebendo ainda "ajuda de ...